Love Trees
Sinopse
Uma dor surda cresce na sombra. Lisboa já não é a cidade da luz diáfana, mas um labirinto trevoso sem ponto de fuga. A cidade, símbolo de progresso e civilização na tradição clássica, não passa hoje de um presídio de almas à deriva sujeitas à lei de Darwin, ao princípio sacrossanto de que só o mais forte sobreviverá. Uma náusea fria e cinzenta tolda os sentidos e depressa a confusão cognitiva e o vazio emocional tornam-se o cimento de um pânico crónico. Cimento real e metafórico que aprisiona corpo e espírito num colete de forças psíquico. Mas talvez haja um caminho de regresso à terra pura da liberdade. E para fazer o caminho é preciso atravessar uma ponte, onde as dúvidas e os medos acenam com os velhos fantasmas. Mas do outro lado da ponte, ultrapassando a vertigem do abismo, fechando os olhos e respirando fundo, abre-se um novo horizonte e insinua-se um sentido, tão fresco como uma manhã de Primavera. Na Mata dos Medos, pulmão verde da margem sul do Tejo, onde as árvores são seres vivos e pulsantes (ao contrário dos espectros fantasmagóricos que habitam a cidade) dá-se o reencontro com Gaia, a grande Mãe. E com Eros, a pulsão primordial, e sexual, vivificante na presença misteriosa de uma mulher enigmática..Afinal, a cidade podia ter tentado matar Deus e esvaziar os céus e a terra de sentido (Nietzsche dixit), mas o Amor não é facilmente aniquilável. E no regresso ao seio materno da natureza, o Amor faz-se anunciar de novo. Só que, enquanto o Amor de Gaia, a Mata dos Medos, é estabilizador e aconchegante, o Amor de Eros, o misterioso vulto feminino, é imprevisível nos seus desígnios.E da mesma forma com que se faz anunciar sem aviso prévio, também pode eclipsar-se como uma miragem etérea que joga às escondidas com a volatilidade do desejo humano.
Guião
01 - EXT - SONHO PRAIA - DIA
Durante um calmo, tranquilo e luminoso passeio à beira-mar, a atenção detém-se numa onda que traz uma garrafa transparente. No interior da garrafa há uma mensagem escrita à mão: “Consegues ouvir-me?”. Uma voz feminina e longínqua começa a cantar. Olhando em todas as direcções, na tentativa de apurar a origem da voz, de repente a atenção detém-se num vulto. Ao longe, uma mulher quase desnudada, apenas coberta com um manto branco e translúcido, banha-se sensualmente no mar enquanto canta. No entanto, a visão e a voz cristalina são abruptamente interrompidas.
CORTA
02 - INT -AUTOMÓVEL NA PONTE 25 DE ABRIL - DIA
O sonho é interrompido pela buzinadela irritante de um condutor mais impaciente. Uma floresta de automóveis cresce como cogumelos no acesso à ponte. O automóvel desliza mais uns metros ao som das playlists dos automobilistas. Da direita vem um riff de guitarra eléctrica. Da esquerda, a voz de uma cantora pop. O automóvel chega enfim à “alfândega” que monitoriza a entrada na cidade. Porque é preciso pagar para entrar na cidade.
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03 - INSERÇÃO DE TEXTO
Texto: Não há almoços grátis. Muito menos pequenos-almoços com vista para o rio.
CORTA
04 - EXT - PONTE 25 DE ABRIL DIA
Um resto de donut é atirado para o banco ao lado do condutor. Uma névoa cinza estende o seu manto sobre Lisboa. Matizes de céu cinzento que fazem adivinhar uma estranha negritude sobre a cidade. O som dos veículos que cruzam a ponte é metálico. Também feitos de metal parecem os condutores sonâmbulos que se dirigem para a cidade como robots pré-programados. Lá em baixo, as ruas e avenidas de Lisboa assemelham-se a veias congestionadas e os seres humanos, na sua trajectória pré-definida, não se distinguem de formigas que obedecem cegamente a ordens superiores, enfileirados numa rotina matemática e orfã de qualquer vestígio de criatividade.
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CORTA
05 - INSERÇÃO DE TEXTO
Texto: A normose é a doença da normalidade. A normalidade é a lei da sobrevivência.
CORTA
06 - EXT - AVENIDA DE LISBOA - EDIFÍCIO SEDE DA CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS - DIA
Um céu negro cinza vigia a cidade. A cidade expressa a sua força através de edifícios imponentes (sede da Caixa Geral de Depósitos). O dinheiro é o sangue e a força omnipresente que domina a cidade. É preciso pagar para viver na cidade. Por isso, joga-se mais um dia de sobrevivência nas slotmachine’s da EMEL. Enquanto é efectuado o pagamento para permanecer na cidade, corpos apressados, enfiados em camisas de força, fato e gravata para eles, e tailleurs para elas, sobem e descem as ruas num redemoinho incessante.
CORTA
07 - EXT - ESTAÇÃO DE METRO LISBOA - DIA
O céu continua cinza. É preciso descer às catacumbas da cidade. A estação de metro é o coração oculto da cidade. É preciso pagar de novo para viajar no submundo da cidade. As pessoas não caminham, correm. E aceleram o passo, insensíveis a tudo aquilo que se desvie, e as desvie, da sua rota. Por isso, mendigos, músicos, artistas de rua são obstáculos ao seu trânsito obstinado.
CORTA
08 - INT - CARRUAGEM DE METRO - DIA
Rostos anónimos coabitam o espaço exíguo da carruagem. Apesar da proximidade dos corpos, que quase se acotovelam, é preciso manter uma distância interior de segurança. Cada ser humano manté-se no seu transe hipnótico, seja através de uns headphones, da leitura do jornal ou de um livro ou apenas da concentração de um olhar vítreo perdido na janela da carruagem.
CORTA
09 - EXT - SAÍDA DO METRO RESTAURADORES - JUNTO À LOJA DO CIDADÃO - DIA
Uma chusma de pessoas é depositada na rua como se tivesse sido projectada por um sopro invisível. Cuspidas pela boca voraz da saída do metro. A vertigem adensa-se à medida que o céu escurece. As pessoas correm de novo, desfocadas de si próprias, mas focadas no trajecto pré-programado que as orienta como robots obedientes.
CORTA
10 - INT LOJA DO CIDADÃO - DIA
Há senhas para tudo. Num ecrã as pessoas são transformadas em números de contabilidade. Tudo são números, seja no levantamento a partir de uma caixa multibanco, seja nas facturas para pagar ou no tempo de espera para ser atendido. O desfile de números é interrompido por uma mensagem de telemóvel: “Não atendes o telemóvel pa? Tens trabalho hoje...15h Festa VIP de Angariação de Fundos contra a Pobreza...Caga na pobreza e vê mas é se arranjas alguma história”. É preciso esquecer a pobreza realmente porque ela está em toda a parte. Imigrantes que tentam comprar o direito à cidadania numa loja de conveniência. Cidadãos cada vez mais empobrecidos com a torrente de contas para pagar. Ou...
CORTA
11- EXT LOJA DO CIDADÃO - DIA
…Os pedintes que se acumulam à porta da loja, mas que já não têm direito sequer ao estatuto de cidadãos. A naúsea e a vertigem avolumam-se. Os passos no passeio público parecem desconectados. Os sons da cidade amplificam-se como rugidos de leões na selva. Por entre a cacofonia, um outro som faz-se anunciar...
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CORTA
12 - EXT SONHO NA FLORESTA -DIA
Caminhando na mata, por entre a luminosidade que desce serpenteando as copas das árvores, há um canto de voz feminina. Por entre a harmoniosa melodia, uma voz interroga: “Consegues ouvir-me? Eu sei que não me consegues ver...”
CORTA
13 - INT FESTA DE VIP’s - DIA
O sonho é interrompido por uma voz feminina, bem menos agradável do que aquela que habitava o mundo onírico: “Viste? Viste? Apanha a gaja...” A festa tem personagens de segunda e primeira categorias. E aos de primeira é preciso capturá-los como presas. A arma é a objectiva da câmara. Flashs de luz artificial inundam a sala. Todos querem ter um lugar ao sol na passadeira da fama. E pouco importa que a luz que procuram sejam artificial.
CORTA
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14 - INSERÇÃO DE TEXTO
Texto: À mulher de César, Não basta ser. Nem parecer. É preciso aparecer.
CORTA
15 - INT FESTA DE VIP´S - DIA
Mulheres de todos os tipos, feitios e gostos insinuam-se diante da câmara. Vestem-se para seduzir, mas já não lhes resta pingo de sedução. Porque já não são mulheres, são figuras espectrais que repetem gestos e palavras mecânicos. A abundância de comida nas mesas disfarça o vazio que explode no interior. Alimenta-se o estômago, mas a alma continua sem chama. A vertigem e a náusea aumentam. É preciso lavar a cara na casa-de-banho para manter a lucidez. E correr dali para fora. Correr para qualquer lado. Não importa para onde...
CORTA
16 - EXT FESTA VIP’S - FIM DE TARDE
Correr, correr, correr. O carro está já ali...
CORTA
17 - INT AUTOMÓVEL NAS RUAS DE LISBOA - FIM DE TARDE
Prego a fundo no acelerador. A cidade assemelha-se a um labirinto sem saída.
CORTA
18 - INT AUTOMÓVEL ENTRADA NA PONTE 25 DE ABRIL - NOITE
Um turbilhão de sons, imagens e pensamentos.
19 - FLASBACK
Flashback de imagens de pedintes na rua e no metro, das pessoas nas ruas como robots sem livre arbítrio e das mulheres sequiosas na festa de VIP’s.
CORTA
20 - INT AUTOMÓVEL - NOITE
A meio da ponte, o turbilhão transforma-se numa explosão vertiginosa. Lá em em baixo o rio parece ameaçador e as estruturas da ponte podem desmoronar-se a qualquer momento. É preciso fechar os olhos. É preciso esquecer. É preciso fingir que a morte não está mesmo ali.
CORTA
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21 - NEGRITUDE ABSOLUTA
O som dos automóveis na ponte é ensurdecedor. O rodado dos automóveis no pavimento metálico da ponte é uma espiral agonizante. Os olhos permanecem fechados. As trevas prevalecem. E, na mais profunda negritude, a mesma voz feminina volta a ecoar: “Consegues ouvir-me? Não te consigo ver”.
CORTA
22 - INT AUTOMÓVEL PONTE 25 DE ABRIL - NOITE
De repente, os olhos abrem-se mesmo a tempo de uma travagem busca que evita o choque contra o carro da frente. O coração quer saltar do corpo. Nesse momento, uma claridade misteriosa, um flash de luz invade todos os sentidos.
CORTA
23 - SONHO NA MATA DOS MEDOS - NOITE
Silêncio profundo quebrado apenas pelo restolhar das folhas. Um vulto passa por entre as árvores como um fantasma. O passo é acelerado para tentar identificar a misteriosa presença. O vulto passa novamente diante do trilho mas desaparece com a mesma velocidade com que apareceu. A respiração começa a ficar cada vez mais ofegante e o passo acelerado dá lugar a uma correria desenfreada no escuro da mata. De repente, um pé em falso e uma queda no abismo...
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CORTA
24 - INSERÇÃO DE TEXTO
Texto: É preciso descer ao inferno para sentir a atracção do Alto.
25 - INT AUTOMÓVEL MATA DOS MEDOS - DIA (MADRUGADA)
O sonho é interrompido pela buzina do carro. O corpo cansado havia adormecido sobre o volante. É tempo de despertar. O dia nasce lá fora. Tudo não passou de um sonho?
CORTA
26 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA (MADRUGADA)
A porta do carro é aberta e à espera o som de maresia longínquo e o primeiro chilrear dos pássaros. A luz é inacreditavelmente transparente e magnética. Tudo está inacreditavelmente vivo e pulsante. A floresta respira vida por todos os poros. E as árvores não são simplesmente árvores. São seres vivos...
SEQUÊNCIIA DE PLANOS DE ÁRVORES - Nota: Aqui a ideia é jogar com as árvores - personagens do livro Love Trees. À medida que o protagonista caminha, vai-se deparando e deixando enfeitiçar por cada uma das árvores.
27 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA
Árvore 1 -
CORTA
28 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA
Árvore 2 -
CORTA
29 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA
Árvore 3
CORTA
30 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA
Árvore 4.
CORTA
31 - INSERÇÃO DE TEXTO
Texto: A Mãe espera sempre pelo regresso do filho.
CORTA
32 - EXT - MATA DOS MEDOS - DIA
Em êxtase, há uma profunda comunhão com a Mãe, Gaia. A mata e as árvores fornecem o aconchego há muito esperado. Uma voz doce, suave e feminina acompanha o transe místico. Mas a mata encerra outros mistérios. O estado de fusão profunda com a floresta é interrompido por uma visão inesperada. Uma mulher desnudada dança entre as árvores...
CORTA
CORTA
33 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA
Quem é aquela mulher? Que visão é esta? O coração parece saltar de novo do corpo e a respiração fica ofegante. É preciso ir até lá. O passo é acelerado rumo à visão. Mas a mulher escapa-se ainda mais rapidamente. Na clareira onde a mulher dançava já não há qualquer vestígio daquela presença divina e erótica. O desespero começa a instalar-se quando a mulher aparece de novo rodopiando de novo num bailado incessante num ponto mais afastado da mata. E a doce melodia regressa também ao seio da floresta.
CORTA
34 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA
É preciso correr, nada existe mais urgente do que conseguir chegar perto daquela mulher....Mas novamente uma corrida de fundo em vão. A visão eclipsa-se de novo. A mulher dançava junto da árvore do amor (aqui a ideia é escolher um dos locais e árvores mais emblemáticos e que simbolize o amor erótico). No chão, há um manuscrito num papiro de outra época, ou melhor, de um tempo sem tempo: “Agora já sei que me consegues ver”
CORTA
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35 - INSERÇÃO DE TEXTO
Texto: Ying está em todo o lado e em lugar nenhum, mas se é difícil encontrá-la, mais difícil é domá-la...
CORTA
36 - INSERÇÃO DO TÍTULO DO FILME : LOVE TREES
CORTA
37 - EXT MATA DOS MEDOS - DIA
Com o manuscrito na mão, reina o silêncio na floresta. A mulher partiu, mas deixou um sinal...Por agora, resta o conforto da Mãe.
CORTA
38 - INSERÇÃO DE TEXTO
Texto: “Sabes bem que por Amor tudo se move”, Luis de Camões
CORTA
39 - GENÉRICO e CRÉDITOS
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